domingo, 29 de novembro de 2009

SINAIS DO TEMPO A PASSAR


Enquanto a neve não chega, o nosso olhar pode alegrar-se com o tapete rubro que cobre o chão dos soutos. Aquele vermelho, tão forte e tão vivo, cola-se à retina e permanece nela como memória de calor para o Inverno que chega. Houve tempos em que esse tapete, retirado do seu natural, era estendido pelas ruas e, por breves instantes, o lodaçal em que as primeiras chuvas as tinham transformado via-se ocultado por aquela garridice. Mais tarde, em lição que a ecologia moderna deveria aprender, cada um recolhia o que lhe calhara à porta, transformado no mais perfeito estrume, o húmus que nos sustenta.

Os castanheiros ficaram nus e, assim despidos, têm a aparência transparente dos anjos. Os castanheiros são os anjos da guarda das gentes que deles tira o sustento e que deles cuida com desvelo.

Na paisagem, o nevoeiro cria um véu atmosférico lembrando-nos que o Natal está à porta. As casas estão abastecidas de pão para a vida e de lenha para o lume. Deus nosso Senhor cuidou de nós mais um ano.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

ROSTOS

Retomando a saga, agora que é tempo de a neve voltar a cair

Desta vez nem me atrevo a pedir que se identifique mais alguém a não ser os nossos estimados professores. No entanto, se alguém quiser tentar, sinta-se à vontade. Assim sendo, o desafio consiste em tentarmos identificar os lugares fotografados.



Lugar

1 - Fonte da Vila, à descida para a canada da Ribeirinha ?

2 - Vale de Espada, avistando-se a Cabeça?







Lugar:

1 - Eira da cabecinha, vendo-se a casa velha do tio Mandinho?

2 - Horta da tia Estefânia, vendo-se a casa do Moreno?

3 - Horta e casa do tio Jarrete?

4 - Largo do prado e casa da Maralha?


5 - Terra do tio Carlos Chiote e palheiro anexo à casa da residência?

6 - Eira do Outeiro e palheiro do tio José Çuca ?

7 - Terra frente à casa do tio Carlos Chiote. A casa seria a primitiva do tio Alfredo Guerra, deitada abaixo. Ao fundo, a parte baixa da eira da Cabecinha

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A segunda fotografia foi alvo do maior número de alvitres. Lidos e cotejados todos os comentários, penso que devem ser excluídas as hipóteses 2,3 e 4. As restantes parecem-me mais verosímeis, mas carecem de confirmação. A ver vamos, se conseguimos.

(Actualização feita em 12/12/09)


domingo, 15 de novembro de 2009

EM TORNO DAS CASTANHAS

Pretende-se que este seja um artigo colectivo subordinado a um tema e não a uma ordem.
Espero o contributo de todos e, à medida que forem surgindo na caixa de comentários (ou no e-mail), tratarei de os acrescentar aqui.

Começo com os comentários que o Tonho do tio Arnaldo e a Augusta escreveram ao artigo anterior:

O S. Martinho] era o dia do famoso magusto que fazíamos (quando não dava para o fazer no 1.º de Novembro) entre rapaziada jovem, lá para os lados de Cadavez. Cada um levava algo para comer ou beber: marmelada, nozes ou figos secos, aguardente ou vinho doce, porque a jeropiga não se encontrava facilmente. Enforretávamo-nos todos, cantando e bailando em volta das castanhas assadas no meio das giestas, cheias de cinza, estoirando como se fossem os foguetes da festa.
António Braz Pereira


Quanto aos magustos em Rebordainhos, apenas me lembro deles no dia 1 de Novembro. E que paródia. Um dos últimos culminou com a prova da aguardente que o Rafael estava a fazer! Bem, não imaginam a figura dos pares dançantes, no baile que se seguiu na casa do povo!
Os dois avós do meu marido foram combatentes em França e, depois que vieram, todos os dias 11 de Novembro festejavam e, nomeadamente em casa dos pais do meu sogro, era dia de rancho melhorado. Ano, após ano, assava-se um cabrito, para comemorar este dia.

Augusta Mata


Gosto de dizer "magosto" porque foi assim que aprendi, soando-me aquele -o- de "gôsto" mais apelativo e conforme à quantidade de sensações boas que, na minha infância, associo à castanha. É verdade que castanha me lembra bailarico e cantigas (como era aquela que dizia que os homens são como a folha do castanheiro?), dedos espetados à cata delas por entre as brasas e, depois, mãos a atirá-las ao ar, como quem está a jogar às jogas, para as arrefecer. Lembra-me, ainda, os sopros que eram risos, a algazarra e o cheiro bom do fruto assado na brasa perfumada da giesta.

Mas o que mais me lembra é o riso bom do meu pai que regressava a casa, sempre, com os bolsos cheios de bilhós. O riso dele era de deleite pela alegria que, sabia, proporcionaria aos filhos e nessa alegria estava toda a paga que contava receber da vida.
- "Ora mete a mão no meu bolso!", dizia, pondo-se a jeito. E nós tirávamos mãos cheias de castanhas assadas, já descascadas, que nos sabiam muito melhor do que quaisquer outras.
Em garotos aceitamos as coisas como são, mas agora ponho-me a pensar qual seria o milagre que fazia com que os bilhós mornos nunca se acabassem nos bolsos do meu pai.
Fátima Pereira Stocker

Chegava Novembro, chegava o magusto.
Acontecia sempre antes de o tempo começar a enfarruscar, antes de as silvas adormecerem brancas nas sebes. Era o despedir dos longos dias quentes de Verão.

Viviam-se alegres momentos de convívio. Lembro-me que, para o efeito, se colocavam as castanhas num buraco previamente cavado na terra. Em cima...lenha, muita lenha, que fazia com que longos tufos de fumo se erguessem abertos no céu.
As pessoas enfarruscavam-se e as cantigas desafiavam-se o mais rumorosamente possível. E, à volta de qualquer castanheiro da idade do mundo, os pares levantavam nuvens de pó.

Enquanto as castanhas duravam, prolongavam-se os magustos em casa de cada um e, em cima da lenha a arder, com os movimentos ritmados do mexer do assador enfarruscado, faziam-se bilhós que todos nós íamos descascando e saboreando. Ao mesmo tempo, deixava-se a imaginação correr desenfreadamente e contavam-se curiosas histórias de ladrões ou almas penadas.
Havia sempre novidades a discutir e memórias para lembrar.
Jogava-se ao "esconde esconde, não digas nada a ninguém...", ao "arrebunhana, sobraldana" até cedermos às leis do sono e do cansaço para, depois, sonharmos com castanhas, castanheiros e soutos.

Olímpia Pereira

Dos magustos transmontanos não tenho memórias. Mas da palavra "BILHÓ"... Oh, se tenho... Era assim que o meu pai chamava à minha filha mais velha, quando nasceu, era pequenina,(2,750), e lembro:- Ó Bilhó, vem daí, que (b)vou a conta-te, uma historieta. Feliz, a Bilhó lá se sentava no colo, e o conto acontecia. Já passaram 30 anos, mas ainda tenho saudades!

Eduarda Santos Pereira

Lembro também a delícia das castanhas mamotas "furtadas" do caldeiro da vianda dos cevados! E o jogo a arrebunhana ao serão com os mais velhos, em que eles nos ganhavam quase sempre, mas que no final, para nossa satisfação, generosamente nos devolviam todos os bilhós.
A minha lembrança nesta diversão é com o meu tio Jaime e tio Zé.

Céu Fernandes

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

S. MARTINHO

[Variante do anterior]


Hoje é dia de S. Martinho, o monge bondoso que foi abençoado por Deus por ter oferecido a sua capa a quem, no Inverno, precisava dela.

Por esta altura, nas terras da castanha, os donos dos castanheiros autorizam o "rebusco". O rebusco é uma prática secular e funciona como uma interrupção no direito de posse. No tempo do rebusco, aqueles que nada têm são livres de procurar em qualquer terra e em volta de qualquer castanheiro, os frutos que haja ainda por apanhar. No tempo do rebusco lembra-se que Deus deu a Terra e os seus frutos a todos os homens e, por isso, uma pessoa sem alimento é uma ofensa à pessoa de Deus. Deus irmana os homens e, em certas ocasiões, os homens lembram-se disso. Castanha era caldo e era pão; castanha era sustento e sobrevivência. Como negar isso aos irmãos?

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Nos campos enlameados da Flandres, a morte era o sustento da raiva. Nas trincheiras nem sequer se sobrevivia: apenas os corpos escapavam à morte. Nas trincheiras, o inferno era de frio e de lama e os danados eram os corpos dos jovens em putrefacção.

Nos campos da morte, talvez alguém se tenha lembrado que era o tempo da castanha. No tempo da castanha assinou-se a paz. Os irmãos só existem se houver paz. No tempo da castanha assinou-se a vida.

Nov. 2005

O Armistício que pôs fim à I Guerra Mundial faz hoje 90 anos

domingo, 8 de novembro de 2009

O DEVIR DAS ESTAÇÕES


A nossa terra está assim: linda nos matizes outonais. A chuva que escasseara durante o ano lembrou-se de aparecer, permitindo o reverdescer do chão já agradado. Lombos e chãeras, solheiros e absedos tingem-se de cor, última garridice antes que o Inverno instale a sua austeridade cromática.

Temia-se o pior, mas, não sendo de fartura, o ano trouxe colheita bastante de castanha. E porque caiu bem, apanhou-se depressa, por isso não deve tardar muito a chegar o rebusco. A tradição do rebusco é, para mim, uma das mais belas da nossa terra, porque reflecte a partilha com quem nada tem dos bens que estão em nossa posse. Mostra, ainda, respeito para com a natureza que se não deve exaurir: os frutos deixados para trás serão uma espécie de sacrifício ofertado a Deus e à Terra que nos sustenta.

Penso que o rebusco tem o seu fundamento na seguinte passagem da Bíblia:

Quando tu segares a seara dos teus campos, não cortarás rés do chão o que tiver crescido sobre a terra; nem enfeixarás as espigas que tiverem ficado.
Não recolherás também na tua vinha os cachos que ficaram da vindima, nem os bagos que caíram; mas deixá-los-ás tomar aos pobres e aos peregrinos.
(Levítico, 19, 9-10)

Não colhas tudo o que Deus pôs à tua disposição, partilha com os pobres e com quem, por ser estrangeiro, precisa de sustento - eis a súmula desta passagem. O rebusco é uma bela materialização da lei de Deus.

Os mais atentos perdoar-me-ão a escolha de versão tão arcaica do texto bíblico, opção que justifico, exclusivamente, pela poesia que lhe está intrínseca e que sinto ausente de algumas traduções mais modernas.
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Fotografias da Olímpia (Nov. 2009)

terça-feira, 3 de novembro de 2009

ROSTOS


Vamos abrir mais uma gaveta das nossas memórias. Esta será mais fácil, porque mais recente. Quem se lembra, então, das pessoas destas duas fotografias?




À esquerda - Tia Zulmira Pereira


À direita - Ifigénia Pereira










Maria da Conceição Pires (Tia Vermelha)