Orlando Martins é natural de Rebordaínhos e é nosso primo. Crescemos lado a lado, apenas a rua estreita a separar as casas de nossos pais.
O Orlando, além de bom amigo, guarda talentos insuspeitos de pintor e de poeta.
Hoje, apresentamos aqui um poema seu que é versão de um dos mais belos sonetos de Florbela Espanca. É uma forma de, usando da liberdade poética, continuarmos a festejar a liberdade que Abril nos deu.
É amar, é ser, e não ser amado…
Desejar quem se deseja…
Morder como quem beija…
Dar tudo sem o sentir…
É ser Rei, saber pedir…
É ser mendigo e dar como quem seja
Um homem que rasteja por amor
Dos reinos de aquém e além dor
Ser poeta é ser desejado…
Incompreendido, inconformado…
É ter de mil desejos o esplendor
É nem saber sequer que se deseja
É nascer, lutar e renascer…
É falar sem medo, é calar…
É ter cá dentro um astro que flameja
É ter asas e garras de condor
É ter fome, é ter sede de infinito
E por defesa, meu Deus, me permito
Ter o elmo das manhãs de oiro e cetim,
Para que calem e passem o meu grito
Na guerra onde se agasta
Nos chãos onde se arrasta
Dos resto do homem que fiz
Deixai-me só…poeta e feliz
E antes que me julguem
Irei gritar, farei tremer….
Condensar o mundo num só grito
Descansar até morrer
É amar-te assim perdidamente
É ser alma e sangue em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente…
Florbela Espanca / Orlando Martins 2001
O Orlando, além de bom amigo, guarda talentos insuspeitos de pintor e de poeta.
Hoje, apresentamos aqui um poema seu que é versão de um dos mais belos sonetos de Florbela Espanca. É uma forma de, usando da liberdade poética, continuarmos a festejar a liberdade que Abril nos deu.
SER POETA
Ser poeta é ser mais alto…
É ser mais do que ninguém
Gritar como quem canta…além…
É ser maior do que os homens…
Ser poeta é ser mais alto…
É ser mais do que ninguém
Gritar como quem canta…além…
É ser maior do que os homens…
É amar, é ser, e não ser amado…
Desejar quem se deseja…
Morder como quem beija…
Dar tudo sem o sentir…
É ser Rei, saber pedir…
É ser mendigo e dar como quem seja
Um homem que rasteja por amor
Dos reinos de aquém e além dor
Ser poeta é ser desejado…
Incompreendido, inconformado…
É ter de mil desejos o esplendor
É nem saber sequer que se deseja
É nascer, lutar e renascer…
É falar sem medo, é calar…
É ter cá dentro um astro que flameja
É ter asas e garras de condor
É ter fome, é ter sede de infinito
E por defesa, meu Deus, me permito
Ter o elmo das manhãs de oiro e cetim,
Para que calem e passem o meu grito
Na guerra onde se agasta
Nos chãos onde se arrasta
Dos resto do homem que fiz
Deixai-me só…poeta e feliz
E antes que me julguem
Irei gritar, farei tremer….
Condensar o mundo num só grito
Descansar até morrer
É amar-te assim perdidamente
É ser alma e sangue em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente…
Florbela Espanca / Orlando Martins 2001
O poema de Florbela Espanca está, inteirinho, dentro desta versão do Orlando, a que ele chama uma brincadeira. Não é brincadeira aquilo que vou fazer a seguir, mas o nosso poeta saberá perdoar-me o atrevimento.
De um modo geral existe sintonia no entendimento que ambos fazem do que é ser poeta: ser mais, ser maior, amar alguém. As diferenças – que existem – surgem ou em estrofes inteiras, ou em versos soltos. Assim, se Florbela se satisfaz em afirmar que ser poeta “é ser mendigo e dar como quem seja / rei”, o Orlando inverte os termos afirmando que “É ser Rei, saber pedir”. Por outro lado, se o rei da Florbela é “Rei dos reinos de aquém e de além dor”, o mendigo do Orlando “rasteja por amor / dos reinos de aquém e além dor”.
O elmo – “as manhãs de oiro e de cetim” – de que Florbela fala é de fora para dentro: protege-a do mundo. O elmo do Orlando é de dentro para fora: as manhãs servem-lhe para calar o seu grito.
A poetisa nunca se afasta do eu, mas o Orlando acrescenta, antes da chave de ouro, seis versos (uma quadra e meia) que, podendo ser interpretados como manifestação do eu, se afiguram como o eu voltado para o mundo, um eu poético preocupado com a guerra e a humilhação do Homem. Por que outro motivo estariam os dois primeiros versos desse conjunto escritos na terceira pessoa (“Na guerra onde se agasta / Nos chãos onde se arrasta”)?
Dito de outro modo: servindo-se de cada uma das palavras de Florbela Espanca, o Orlando Martins quebrou-lhes a estrutura, alterou-lhes a ordem e a métrica e fez um poma totalmente novo de que gostei muito.
De um modo geral existe sintonia no entendimento que ambos fazem do que é ser poeta: ser mais, ser maior, amar alguém. As diferenças – que existem – surgem ou em estrofes inteiras, ou em versos soltos. Assim, se Florbela se satisfaz em afirmar que ser poeta “é ser mendigo e dar como quem seja / rei”, o Orlando inverte os termos afirmando que “É ser Rei, saber pedir”. Por outro lado, se o rei da Florbela é “Rei dos reinos de aquém e de além dor”, o mendigo do Orlando “rasteja por amor / dos reinos de aquém e além dor”.
O elmo – “as manhãs de oiro e de cetim” – de que Florbela fala é de fora para dentro: protege-a do mundo. O elmo do Orlando é de dentro para fora: as manhãs servem-lhe para calar o seu grito.
A poetisa nunca se afasta do eu, mas o Orlando acrescenta, antes da chave de ouro, seis versos (uma quadra e meia) que, podendo ser interpretados como manifestação do eu, se afiguram como o eu voltado para o mundo, um eu poético preocupado com a guerra e a humilhação do Homem. Por que outro motivo estariam os dois primeiros versos desse conjunto escritos na terceira pessoa (“Na guerra onde se agasta / Nos chãos onde se arrasta”)?
Dito de outro modo: servindo-se de cada uma das palavras de Florbela Espanca, o Orlando Martins quebrou-lhes a estrutura, alterou-lhes a ordem e a métrica e fez um poma totalmente novo de que gostei muito.
Fátima Stocker
10 comentários:
Orlando amigo!
Quis vir aqui de imediato após a publicação do post pela Fátima, para vos dar aos dois os meus parabén, a ti pela feitura e adaptação do Poema e à Fátima, pela introdução e comentário .
Parabéns Orlando!
Ainda bem que me lembrei de te enviar o Link do blog e pedir a tua colaboração.
Tenho que conversar contigo, para seres um membro do blog de pleno direito, e seres tu a publicar os teus post, quando e como quiseres.
Um grande abraço
Se há alguém que com o seu saber...e SER, possa ajudar a crescer este blog que é nosso, que é de Rebordaínhos e de quem o quiser visitar, esse alguém é seguramente o Orlando. Ele sabe o porquê desta minha afirmação. Ambos sabemos.
Por isso Orlando, toca a avançar, e começa de imediato a colaborares com a malta.
Já agora posso pedir-te um favor?
Faz lá uma digitalização dum daqueles teus desenhos e, mostra ao mundo a nossa aldeia vista pelos teus olhos.
Um beijo grande
Augusta
Tenho muito orgulho em manter uma grande cumplicidade com o Orlando.Ele é primo, amigo, irmão, confidente.Foi com ele que partilhei as brincadeiras e travessuras de infância.
Obrigada Orlando, por nos teres presenteado com esta maravilhosa poesia.
Sei dos teus talentos e, acredita que muito gostaria que os começasses a revelar. Bjinhos
J.stocker
Rebordaínhos é uma freguesia que tem muito para dar à blogosfera. Estou a ver. Não creio que toda a família se mantenha por Trás-os-Montes mas que fora da região faz jus à terra que os viu nascer é uma verdade incontestável. Escrevo e enquanto o faço, vem-me à memória, um homem grande, em todos os sentidos, nascido ,também ele, nas fragas do nordeste: Miguel Torga.
Não sou especialista em poesia, nem me detive muito na análise do poema, estruturalmente falando,que está muito bem feita pela Fátima. Obrigada, Fátima! Li, reli com muito gosto. A versão do vosso primo está soberba à luz dos tempos que nós defendemos, que queremos ver definitivamente implantados e cremos que um dia virão.
De poesia, alimento de que não prescindo, aprecio o poder encantatória das palavras e da mensagem que pretendem passar. Porque um e outro aqui apreciei, faço votos para que o vosso primo continue a colaborar neste blogue recém-descoberto mas onde já venho com muito gosto.
Um beijo
Cara Sophiamar
Só por saber o que são fragas, já merece um aplauso de todos os transmontanos!
Agradeço-lhe, em nome dos naturais de Rebordaínhos, os elogios que aqui deixou. Para nossa pena, são muito poucos os que, de nós, por lá se mantiveram, mas regressamos sempre e, um dia, será para sempre.
O Orlando irá colaborar mais, pode ter a certeza. Fá-lo-á por nosso intermédio enquanto se não decidir a fazê-lo por si próprio.
Agradeço-lhe por ele e por mim as palavras que nos dirigiu.
Um abraço
Fátima
Cara Sofhiamar
Obrigada pelo comentário!
A sua vinda a este cantinho de Rebordainhos é sempre apreciada.
Obrigada, as suas palavras levam-nos a tentar fazer mais e melhot.
Um beijo
Adoro este poema!!!SEi de cor cada vírgula acho e às vezes gosto de o dizer em vóz alta... Beijinhos
Sophiamar
Todos os louros são para a Fátima. É que, sem ela, não estaria aqui.
A análise, o enquadramento prosaico são excelentes.
Um grande abraço... ...
Todos os agradecimentos vão para ela.
Orlando Martins
Ora viva, a minha querida Clarinha!
Pois que sejas muito bem-vinda, ainda por cima gostando de poesia e sabendo-a de cor, que é como quem diz: do coração!
Também a sei assim, mas a meus ouvidos torna-se muito mais bela ouvindo-a na voz do Luís Represas.
Beijos!
Fátima
Foi ao som do "LUIS" - Represas
que me deu este "solavanco"
Obrigado
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