Este artigo pretende dar a conhecer uma ilustre figura natural da freguesia de Rebordainhos, mais propriamente do lugar dos Pereiros. Estando esquecida e desassociada à sua terra natal julgo que é dever dar a conhecer um pouco do seu percurso, ainda que de uma forma sucinta.
Francisco António Ochôa (1839-1912), nasceu nos Pereiros a
04.03.1839, filho do Padre Alexandre José Ochôa (1806-?), natural do
mesmo lugar dos Pereiros e de Balbina Ermelinda Romariz.
Apesar de presbítero, o seu pai foi professor de instrução primária na
escola de Rebordainhos, tendo pedido aposentação em 18641 após
“vinte anos de serviço”. A confirmação régia da legitimação por seu pai
aconteceu em 12.06.1855 .
Frequentou o curso de Direito na Universidade de Coimbra entre 1864 e
1869 obtendo o grau de bacharel em Direito. No início da sua carreira
começou por exercer advocacia, estando durante nove anos nas
comarcas de Macedo de Cavaleiros, Vinhais e Bragança. Nesta altura
filiou-se no partido regenerador, tendo sido vereador e administrador
do concelho de Bragança. Seguiu a carreira de magistratura, tendo sido nomeado juiz de direito da comarca
de Bicholim (Índia Portuguesa) a 03.02.1879. Regressado ao continente foi nomeado juiz da comarca de
Vinhais a 16.12.1887 . A 16.09.1888, foi promovido à 2.ª Instância tomando posse como juiz da Relação de
Nova Goa, onde permaneceu até 23.08.1897.
Em Goa, acabou por fazer parte do 29º e 30º Conselho de Governo do Estado da Índia nos anos de 1894 e
1897 respetivamente.
Foi então agregado à Relação de Lisboa por decreto de 02.12.1897, passando a juiz efectivo por decreto de
12.06.1901. Ascendeu a presidente desta instituição por decreto de 8 de Março de 1910, tendo tomado
posse a 12 de Março do mesmo ano como o seu 42º presidente. Ainda como magistrado, foi nomeado juiz
conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça por decreto de 24 de Agosto de 1910.
Republicano, foi eleito deputado à Assembleia Constituinte de 1911 pelo círculo eleitoral de Bragança após a
revolução republicana de 5 de Outubro do ano anterior. Findos os trabalhos desta assembleia que
culminaram na constituição Portuguesa de 1911, tomou posse como senador da Republica Portuguesa,
tendo presidido interinamente à primeira sessão deste órgão.
Faleceu na cidade de Lisboa com 73 anos no dia 22.12.1912.
Link para o artigo completo: http://freixedelo.com/repository/francisco_antonio_ochoa.pdf
segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016
domingo, 28 de fevereiro de 2016
PARTILHAR
Os que vivem na alegria da presença têm-se esquecido da tristeza dos desterrados. Tive que "roubar" para poder partilhar e mitigar as saudades dos ausentes como eu.
Paisagens de Rebordaínhos e dos Pereiros.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016
DAR
por
ANTÓNIO AUGUSTO FERNANDES
Naquele tempo,
no tempo em que o destino deu connosco em Rebordainhos, a tia Lídia, que tinha
a quarta classe (das primeiras alunas que o Sr. Professor Francisco Ribom levou
a exame em Rebordainhos) fazia de enfermeira porque … sabia dar injecções. Como
ainda não tinha chegado o tempo do desperdício e das seringas descartáveis, a
mecânica da injecção tinha o seu quê de complicado. A seringa (de vidro) e a
agulha (porque tanto uma como a outra tinham que durar muito tempo) eram ambas
transportadas numa caixinha inox com um pequeno cavalete metálico. Na altura do
seu uso, voltava-se a tampa do avesso e servia de reservatório onde se deitava
um pouco de álcool e se colocava o cavalete. Sobre este punha-se o resto da
caixa com a seringa e a agulha mergulhadas em água. Incendiava-se o álcool que
ardia até a água ferver e assim se esterilizava o material.
Ora um dia,
pelos começos do Verão, aparece lá em casa um homenzinho cabisbaixo, torcendo
nas mãos nervosas o chapéu velho, muito apoquentado: ─ “Se a Sr.ª Lídia lhe
podia fazer um grande favor, que a mulher estava muito malzinho… O Doutor
tinha-lhe receitado meia dúzia de injecções… mas quem lhas havia de dar?!”
A minha mãe,
coitada, que era (quase) uma santa, lá lhe disse que sim, pois o que é que lhe
havia de dizer?. Só que o homem era dos Vales, e de Rebordainhos aos Vales
ainda é um estirão de respeito pelos velhos caminhos traçados para os carros de
bois. No dia seguinte, lá nos metemos a caminho. E digo ‘nos metemos’, porque,
como já não havia aulas, eu fora destacado para acompanhante na empresa sanitária.
Até à Ribeira a coisa ainda ia: era caminho sobejamente conhecido, pois que
para ali ficavam os lameiros para onde arranchava com os meus primos do Outeiro
atrás das vacas, e era um regalo para os olhos aquele manto verde dos lameiros
pelo vale acima por onde coleava o renque de freixos acompanhando a ribeira que
nascia logo ali acima, no Pórto. Depois é que era o dianho: o calor começava a
apertar e aquela subida, rasgada em diagonal nos costados áridos do Ladeirão , nunca
mais acabava. Para quem não sabe ou não se lembra, os Vales eram um cu de Judas
de meia dúzia de casotas encravadas numa prega a caminho dos cumes da serra,
por onde não se ia para lado nenhum. O carreiro e o mundo acabavam ali.
Lá chegados, aquilo era um silêncio de cemitério. Quer
dizer, não era bem, porque dois ou três miúdos brincavam espolhinhados no chão,
no meio das galinhas que esgaravatavam a leiva, mas uns e outras num silêncio
de convento cartuxo. Minha mãe chamou-os para que lhe indicassem a casa da tia
Maria doente. Levantaram o nariz do chão e, mais selvagens que botocudos e mais
lestos que perdigotos, evaporam-se em segundos, em absoluto mimetismo com a
terra e os ramos dos sequeiros em torno.
Lá teve a enfermeira que gritar o nome da enferma até
que, de um janelo rasgado na pedra nua, surdiu a cabeça desgrenhada da própria:
─ Estou aqui, Sr.ª Lídia!
Esperei sentado ao fundo da escaleira, esmagado por
tanta quietude e tamanha solidão, olhando os montes ermos e quedos, a fraga
grande da Ladeira ao longe, de sentinela à aldeia e adivinhando os três pares
de olhos assombrados a espreitarem entre os ramos do sequeiro. Rebordainhos não
era propriamente a capital, mas ao pé daquilo, bem fazia de metrópole.
As viagens ainda
se prolongaram por uma semana, mas como a tia Maria dos Santos disponibilizou
a sua burrica como meio de transporte para a enfermeira, fiquei dispensado da
tarefa de acompanhante; por isso essa primeira impressão que tive dos Vales foi
também a última e tão funda me ficou que me definiu a convicção de que não
estava mesmo talhado para cenobita.
Passaram-se umas semanas e, um dia, quando me
entretinha naquela varanda dos tempos da minha avó Adriana, uma mulherzinha
pálida e magra, com o lenço pela cabeça sombreando-lhe ainda mais as olheiras
fundas, subiu as escadas com uma cesta de vime enfiada no braço. Minha mãe
acudiu da cozinha.
─ Ó Senhora Lídia, eu vinha-lhe agradecer a
trabalheira que teve comigo. ─ E, isto dizendo, ia destapando a cesta e de
dentro sacou pelas orelhas um coelho taludo, bem mais gordo que a dona,
coitada.
─ Ó rapariga, guarda lá isso. Olha, leva-o e trata de
ti, a ver se ganhas forças, que tu inda andas bem fraquinha.
A moça baixou os olhos embaraçada, acerejaram-se-lhe
as faces pálidas, tremeu-lhe o beiço e futurei que se ia pôr a chorar:
─ Eu bem sei que é pouco… mas eu não tenho paga para
o que fez por mim. E num arranco suspirado: ─ Ai! Era um favor quer me fazia
se… ─ e desatou num choro manso com as lágrimas borbulhando, grandes e mudas.
E minha mãe, já a pontos de chorar também:
─ Está bem, Maria, está bem. Pronto. Deixa lá ver o
bicho.
Bem, talvez não fossem santas as pessoas da nossa
terra na nossa infância, mas tiravam bem as medidas ao sentido do serviço e da
gratidão.
Etiquetas:
António Fernandes,
personalidades da aldeia
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016
INTERLÚDIO QUARESMAL
Este disco e este filme fizeram parte das nossas vidas - e tenho a certeza de que todos guardamos boas recordações dele(s).Creio que se coadunam com o tempo quaresmal que vivemos, por isso os partilho convosco.
O filme está legendado em Português do Brasil. Aqui e ali, surgem erros gramaticais de palmatória. Tende paciência, porque não arranjei melhor.
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016
O PÃO NOSSO DE CADA DIA
Inicio, com este artigo, uma série
dedicada à alimentação, distinguindo entre os dias de festa e os dias de
sempre. O calendário decidiu por qual começar.
DIAS DE FESTA
1 - O ENTRUDO
(imagem retirada daqui)
Talvez fosse no Entrudo que se iniciasse
a desinça do fumeiro, já curado e amanhado em carrelos embarrados num prego
espetado no terceiro ou em qualquer parede da cozinha. Da salgadeira saía a
orelha e a queixada do porco que eram cozidas com chouriças de boche e das
outras, tudo a servir de acompanhamento a umas casulas macias. Os potes ficavam
à roda do lume durante toda a manhã e as mulheres da casa iam-nos virando para
que a cozedura fosse uniforme. Quando a fervura se levantava, os testos eram
ligeiramente afastados e o interior da casa era inundado do perfume quente e
salgado das coisas boas.
As casulas não integravam os hábitos
alimentares de todas as famílias. Nessas casas, o feijão era substituído por
arroz de qualquer coisa, normalmente de espigos, mas os enchidos, cozidos ou
assados, lá estavam a servir de acompanhamento: chouriças e salpicão da língua.
Quem nunca conviveu com a privação não
compreende o Entrudo e desgosta-se da festa. Nós, que percorremos uma infância
de constantes vacas magras, sabemos, contudo, dar-lhe sentido e apreciar-lhe o
sabor.
____
Nota: para este artigo inspirei-me noutro que a minha irmã Augusta escreveu há já bastante tempo (ver aqui). Para poder prosseguir com este assunto preciso de ajuda, por isso, agradeço que, à medida que se forem lembrando, me vão dizendo. Não é preciso nenhum tratado, basta que me digam: não te esqueças disto ou daquilo.
Etiquetas:
alimentação,
Fátima Stocker
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