A ORIGEM
Por trilhos, …caminhos antigos,
De lendas e contos repetidos
Marcados “pari passu”
No calor do ferro e do aço…
Da terra nua, fria e crua
Que te verga e lembra a
Saudade.
Destino ou impotência real
Que perante realidade tal
Já mais não sofro, mas sinto
A meus pés – de lés a lés….
O ser transmontano.
De Aníbal a famílias de Adriano
- o Avô –
E de outros, os seus filhos
Tais como, António, Manuel, João, José
E outros….
E o meu pai
Que pelo valor que tem
O canto em canto próprio.
Orlando Martins (02.01.2002 / 11-2005)
****
Falar dos nossos é também falar de nós, em hossanas pelas raízes que nos alimentam e nos fazem. Esta é, quanto a mim, a síntese de mais um belo poema do Orlando.
A imagem inicial é particularmente sugestiva: os muitos passos, a caminho do trabalho, são passos acompanhados e horas de ensinamento. Os caminhantes somos nós e quem nos acompanha é nosso mais velho que, em cada curva, em cada fraga pisada ou avistada, conta uma e outra vez histórias de vitória ou de medo, de estranheza ou de alegria. Esse contar sempre outra vez dá-nos raízes, firma-nos a uma identidade que, um dia, seremos nós a repetir para continuarmos “o ser transmontano”.
“O ser transmontano” é pertença tremenda. A terra “nua, fria e crua” tanto fere como mata, mas aprisiona as almas como as fragas fazem às mouras encantadas.
O Orlando mostra a ânsia de falar das origens – forma de gritar quem é – saltando directamente da História (Aníbal) para o sangue (Adriano, o avô, mas também imperador de Roma). Tais alusões são, ainda, um modo de elevar ao estatuto de quase divindade aqueles que travam a guerra infindável contra as forças da natureza: os nossos. É nesse elevar tão alto que melhor se manifesta o carinho e a admiração profunda para com os transmontanos de que destaca, naturalmente, o pai.
É por tudo isto que faz sentido publicar este poema em artigo imediatamente a seguir àquele que dedicámos ao Tio António.
Nota: queres tu, Orlando, explicar os versos “Marcados pari passu / No calor do ferro e do aço”?
Fátima Stocker
A imagem inicial é particularmente sugestiva: os muitos passos, a caminho do trabalho, são passos acompanhados e horas de ensinamento. Os caminhantes somos nós e quem nos acompanha é nosso mais velho que, em cada curva, em cada fraga pisada ou avistada, conta uma e outra vez histórias de vitória ou de medo, de estranheza ou de alegria. Esse contar sempre outra vez dá-nos raízes, firma-nos a uma identidade que, um dia, seremos nós a repetir para continuarmos “o ser transmontano”.
“O ser transmontano” é pertença tremenda. A terra “nua, fria e crua” tanto fere como mata, mas aprisiona as almas como as fragas fazem às mouras encantadas.
O Orlando mostra a ânsia de falar das origens – forma de gritar quem é – saltando directamente da História (Aníbal) para o sangue (Adriano, o avô, mas também imperador de Roma). Tais alusões são, ainda, um modo de elevar ao estatuto de quase divindade aqueles que travam a guerra infindável contra as forças da natureza: os nossos. É nesse elevar tão alto que melhor se manifesta o carinho e a admiração profunda para com os transmontanos de que destaca, naturalmente, o pai.
É por tudo isto que faz sentido publicar este poema em artigo imediatamente a seguir àquele que dedicámos ao Tio António.
Nota: queres tu, Orlando, explicar os versos “Marcados pari passu / No calor do ferro e do aço”?
Fátima Stocker
13 comentários:
amigo orlando
Belo poema, na tropa a experiência é um posto, na vida é um "canudo" conquistado na labuta diária, feita a "par e passo"lavada com muito suor e algumas lágrimas, que são hoje o tempero da saudade.
Tambem gostei da cabal explicação da Fátima, que serve aos menos familiarizados com estas vivências doutros tempos
Bem haja
Abraço
Manangão
Ah desgraçado, que me fizeste chorar.
Apetece-me citar Torga:
"O destino plantou-me aqui
e arrancou-me daqui.
E nunca mais as raízes
me seguraram bem em nenhuma terra".
Qualquer dia, respondo-te "à letra".
Parabéns, seu safado!
Beijos
Olímpia
João e Fátima:
Obrigada por estes belos momentos e pelo empenhamento neste blog.Estão a transformar-me numa viciada.
Fátima,as tuas análises são perfeitas mas, será que não reconheceste neste poesia, também um bocadinho do nosso pai?
Prego a fundo, com este blog!...
Aqui está um hino aos transmontanos, a todos os transmontanos que, diariamente trabalhavam de sol a sol para alimentarem a sua prole. E, à noite, apesar do cansaço do trabalho braçal, ainda sabiam como ninguém, acarinhar os filhos, balouçando-os nos seus joelhos.
Parabéns Orlando (já tos havia dado). Parabéns mana e cunhado.
Caro Manangão
Tem muita razão: a experiência de vida é o melhor canudo que pode haver.
Pela minha parte, muito obrigada por suas palavras.
Anónima
(presumindo que é a Olímpia?)
Não é um bocadinho é um bocadão. Assim como o "Já mais não sofro, mas sinto" é o Orlando e é cada um de nós. E se já não sentimos é porque, tanto o pai e a mãe dele como o nosso pai e a nossa mãe foram capazes de arrancar o impossível daquela "terra nua, fria e crua". A terra tirou desforra, "vergando-os", como que a chamá-los, fisicamente, a si!
Beijos e obrigada
Agora, olhando bem, aquele "prego a fundo" parece-me mais da Augusta... Não importa, o que escrevi vale à mesma.
Augusta
A paciência de Jó do nosso pai! Extenuado, ainda nos pulava no colo "arre burriquinho..." e sorria enquanto fazíamos "balancé" nos joelhos dele!
O transmontano fala pelo gesto!
Obrigada e beijos
João
Mais um post que li a "paripassu" com muito gosto. Sou natural daquele Algarve que poucos conhecem, que não vem nos folhetos turísticos, nem cartazes,o serrano, mais genuíno, mais saudável e também muito bonito. Foi aí que, por entre penedos e serranias, veredas e atalhos, vim a este mundo. Talvez por isso aprecie tanto os vossos posts. Por isso e pela qualidade do discrso da Fátima inconfundível onde quer que esteja.
Quanto ao poema do Orlando, a frase síntese do mesmo, feita pela Fátima, está excelente e levou-me a uma releitura calma, degustativa das palavras com que foi escrito.
Voltarei a este canto para comentar os outros posts com o mesmo gosto de sempre.
Do Algarve serrenho para os serranos de Trás-os-Montes envio beijos.
Hoje e sempre à beira-mar!
Fátima:
O seu a seu dono. Claro que aquele "prego a fundo" podia ser meu. Mas não é. De qualquer forma, faço minhas as palavras da Olímpia. Prego a fundo. Pela parte que me toca, faço o que posso e sei. Agora é preciso dar a morada a outros naturais de Rebordaínhos. tenho feito a publicidade possível, mas é necessário continuar.
Beijos
Cara Sophiamar
Tanta gentileza, a sua!
O Algarve em que nasceu é o Algarve de que gosto. Conheci-o, muito jovem, passageira do jeep do gabinete de arqueologia da Fac. de Letras de Lisboa. Era um jeep velhíssimo, conduzido pelo meu professor, mas que trilhava todos os lugares onde não houvesse caminhos. Na serra algarvia senti-me em casa: parecia que estava a ver os meus montes. Por isso, já vê que compreendo muito bem as afinidades que sente.
Um abraço e, mais uma vez, muito obrigada pelas suas palavras.
Augusta
Andemos com ele, então!
Com os de Rebordaínhos, penso, passa-se o mesmo que com a maior parte daqueles que visitam a blogosfera: vêem, mas não dixam sombra de si. Não me parece mal, é apenas uma maneira de estar; quiçá inibição pessoal. Mas divulguemos, sim!
Beijos
Meu caro João
(vale este comentário mais para o post anterior, mas como ambos se completam, digo)
Comentou a MPS um dia num post meu, parafraseando Zeca Afonso: "Só ouve o brado da terra / quem dentro dela veio a nascer".
Reparei que o meu amigo não sendo da terra, Rebordainhos, com ela se identifica como se fosse, lá nisso não haja dúvidas.
São estes relatos, de vidas vividas sempre no limite da dureza do trabalho e dos rigores do tempo, que valorizam os homens e mulheres do campo, neste caso os transmontanos, tantas vezes votados ao ostracismo por parte quem, em Lisboa, rege a acção social destinada ao interior.
Estas gentes humildes que nunca conheceram outra coisa, uma distracção, a não ser trabalho, são completamente ignoradas e, se caso for, hostilizadas pelos “fidalgos” da governação.
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