enxamblar
emxambladeira
enxamblador
As palavras dão voltas
engraçadas: elas próprias, no seu desenho, mas também no seu significado. Neste
caso falamos em evolução semântica.
É clarinha como a água a mudança
de sentido ocorrida com o adjectivo enxamblador/enxambladeira e com o verbo enxamblar,
tão usados quando éramos garotos. Eram palavras de crítica, embora não fossem
ofensivas.
Enxambladeira é, para nós, aquela
pessoa que, atenta ao pormenor, deixa por fazer aquilo que importa, ou seja,
consome o tempo a não fazer coisa que se veja. Enxamblar significa, pois, desperdiçar
tempo e trabalho. Normalmente era a voz zangada da mãe que nos admoestava:
“que
estás tu, para aí, a enxamblar?”
Enxamblar vem de "ensemblar" que
quer dizer entalhar. O trabalho do entalhador é uma arte de minudência, de concentração
obrigatória no pormenor, o que faz com que se não vejam resultados imediatos. Uma
peça entalhada é, por consequência, uma obra de arte muito cara.
Em Rebordaínhos não desdenhamos
da arte, o que não temos é tempo nem dinheiro para ela e é por isso que apartámos
do verbo enxamblar aquilo que o ligava a uma profissão e lhe conferimos aquele
tom crítico que o caracteriza.
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Acrescento este lindíssimo parágrafo de um comentador anónimo:
A expressão coloquial “o que andas para aí a enxamblar?!” quer dizer estás para aí com uma tarefa minuciosa e morosa, que não sei o que é e nem para que serve, quando comparada com o trabalho útil e espetacular do cavador que, no meio do campo inculto, ergue a enxada ao ar e, com os músculos retesados, faz descer com força a lâmina metálica que fende a terra para que a semente da sua esperança em boas colheitas encontre um lugar seguro.
Outro anónimo acrescentou, acertadamente, outro significado à nossa palavra:
Enxamblar pode significar também: corrigir, compor, emendar, consertar algo que se tenha feito de errado.
Por exemplo: depois de fazer u que feze, bêo praqui a enxamblar o enxamblador a enxambladeira.
23 comentários:
Enxamblar vem do francês assembler, que significa juntar.
Por vezes, as terras são como as pessoas: nascem, crescem e morrem.
Há muito, muito tempo, no lugar onde hoje é Rebordainhos não havia pessoas. Mais próximo dos nossos dias, houve tempos em que a aldeia foi sobretudo um lugar de chegada e outros tempos em que foi mais um lugar de partida. Durante a Idade Média, o povoamento do reino foi, em parte, entregue à responsabilidade de ordens religiosas francesas, ou de influência francesa, que trouxeram consigo a cultura das suas terras de origem. Como mera hipótese, porque também não estão à espera de que eu saiba tudo, diria que enxamblar terá vindo com os frades franceses, nessa altura em que foram necessários enxambladores para ajudar a construir casas e igrejas.
A expressão coloquial “o que andas para aí a enxamblar?!” quer dizer estás para aí com uma tarefa minuciosa e morosa, que não sei o que é e nem para que serve, quando comparada com o trabalho útil e espetacular do cavador que, no meio do campo inculto, ergue a enxada ao ar e, com os músculos retesados, faz descer com força a lâmina metálica que fende a terra para que a semente da sua esperança em boas colheitas encontre um lugar seguro.
Olá Fátima!
O meu comentário resume-se apenas ao prazer de ver publicado mais um texto, mesmo não percebendo "patavina” das nossas palavras… aliás, nunca tinha ouvido (enxamblar)?
Sei perfeitamente que os temas escasseiam, sobretudo aqueles mais apreciados pela gente do povo; como sei também que muita gente não ousa comentar, com receio de ser discriminada, enfim… cest la vie!
Obrigado por nos dedicar um pedacinho do pouco tempo que tens libre.
Beijos
Anónimo
É notável a comparação com que encerrou o seu comentário. Vou transcrevê-la para o corpo do artigo.
Faz parte do bê-a-ba da História Pátria distinguir-se a reconquista e o povoamento do Reino entre um Norte de ricos-homens e infanções (ou seja, nobres)e um Sul de ordens religiosas (essencialmente militares), servindo Coimbra de fronteira para essa distinção. Dito isto, parece-me interessante a sua sugestão de que os trabalhos de construção das igrejas tenham sido o meio através do qual as nossas gentes conheceram a arte do entalhamento. Eu não vejo entalhamento nenhum na nossa igreja, mas isso não quer dizer que nunca o tenha tido.
Sobre a origem do verbo enxamblar, reconheço a semelhança com o verbo francês. Contudo, vindo ambas as línguas do Latim, não percebo o motivo pelo qual a palavra entraria no nosso léxico pela via do empréstimo. Em Português arcaico existia a expressão "ensembra" com o significado de "com", "juntamente" (o rei, ensembra com a rainha...). Os dicionários informam que tal expressão vem do Latim "in simul" que se traduz por "em conjunto"
Grata pela sua participação
Tonho
Vejo que o artigo te não disse nada. Paciência, não se pode agradar sempre. Acredito que nunca tenhas ouvido a palavra, mas olha que era muito frequente.
Não é bem falta de assunto, é mais aquilo que disseste depois: a falta de tempo para escrever artigos mais longos e, confesso, um certo desânimo. Apesar disto que acabei de dizer, considero que o nosso vocabulário é tema da maior importância. São palavras nossas, algumas mais antigas do que a Pátria e que, provavelmente, seremos nós os últimos a utilizar. O seu registo é, para mim, da maior importância. Concedo, no entanto, que nem todos pensem da mesma forma.
Beijos e muito obrigada.
Tonho
Ainda cá volto, porque me escapou uma parte do teu comentário.
Se as pessoas têm medo de ser discriminadas, isso significa que eu já as discriminei? Nada mais falso. As pessoas só não participam porque não querem, elas que não inventem desculpas. A ti, em particular, agradeço a enorme constância.
Beijos
Fátima: quando digo que as pessoas se sentem discriminadas ao comentar com os meios de que dispôem, falo do que ouço, mas nunca disse que eras tu a discriminá-los...porque estaria a mentir... pelo contrário.
Desculpa se me expressei, mais uma vez, mal.
Beijos
Fátima:ontem e hoje foram dias de azafama para mim. Não que andasse a emxamblar, antes, nos trabalhos a que me propus depois que a mãe me passou a responsabilidade de zelar pela Senhora de Fátima.Fazes bem em nos fazer relembrar e temos que, muito usados noutros tempos, estão cada vez mais em desuso. E sim, lembro-me muito bem dessa expressão na boca da mãe.
Beijos
Ainda cá volto. Desta vez para corrigir o erro ortográfico que escrevi. Assim, onde escrevi emxamblar deveria ter escrito enxamblar.
Sempre a aprender, desconhecia essa palavra... obrigada Fátima.
Eu também faço parte dos que por aqui passam e poucas vezes comento... falta de tempo... ou simplesmente por não ter muito jeito para a escrita...
Beijos
Lurdes
Tonho
Não te expressaste nada mal, compreendi bem aquilo que querias dizer. Penso, no entanto, que as pessoas confundem discriminação com sentirem vergonha de se exporem em público. Quanto a isso nada posso fazer.
Beijos
Lurdes
Não te amofines: somos donos das nossas vidas e do nosso querer.
Beijos
Augusta
Desculpa lá, passei por cima do teu comentário, mas a resposta à Lurdes vinha em melhor sequência.
Não, a enxamblar é que tu não andaste, porque fizeste obra de encher o olho!
Beijos
D. Fátima
Enxamblar, pode significar também;
Corrigir, compor, emendar, concertar algo que se tenha feito de errado.
Por exemplo; Depois de fazer u que feze, bêo praqui a enxamblar o enxamblador a enxambladeira.
um abraço para aí para todos
Dona Fátima Stocker,
Os meus conhecimentos de História de Portugal podem basear-se em algumas generalizações pessoais e, desse modo, perdem algum rigor de objetividade, mas, por outro lado, penso que, por essa mesma razão, são muito abrangentes.
Na época medieval,pelos tempos da fundação do Reino e reconquista cristã, os habitantes da região de Rebordainhos terão sido foreiros da Ordem do Hospital e do Mosteiro de Castro de Avelãs, portanto é inegável que sofreram influências culturais de ordens religiosas.
Quanto à evolução das palavras, apresento o exemplo do verbo francês constater que, tendo origem direta no Latim, chegou a Portugal na forma constatar apenas por via da França.
Depois destes apartes, resta-me agradecer muito o comentário que fez do meu comentário.
Anónimo das 14 horas
Pois tem muita razão, e obrigada por ter acrescentado. Em termos de sentido, parece-me uma metáfora em que se associa o mal feito e a tentativa de o corrigir ao erro do entalhador: este "fere" a madeira, abrindo fendas na peça. Se errou poderá tentar recolocar o pedaço tirado, mas não conseguirá que o trabalho fique sem mácula.
Vou acrescentar também a sua intervenção.
Cumprimentos
P.S. Será muito pedir que os anónimos inventem um pseudónimo e assinem com ele? É que se está a tornar difícil distingui-los no endereço da resposta.
Anónimo que me tratou por Dona Fátima Stocker
Posso pedir-lhe, como fiz ao anterior, o favor de inventar um pseudónimo? Agradecer-lhe-ia muito a gentileza.
Os Hospitalários e Castro de Avelãs (Ordem de S. Bento) tiveram propriedades em Rebordaínhos? Sim. Também as teve o Arcebispado de Braga (em cuja diocese se integrava). Essas propriedades eram de direito, isto é, doadas com documentos passados? Não o podemos afirmar. Eles foram donos de propriedades em Rebordaínhos, o que é bem diferente de dizer que foram "os" donos da terra, sendo isso que afirma aos escrever que os (ou seja, todos) moradores de Rebordaínhos foram foreiros de tais senhores.
Concluir, da posse de bens de raiz em algumas terras, que o povoamento foi operado por ordens religiosas é um salto muito grande. Na verdade, a nossa região (até Miranda, mas sem delimitações concretas)era responsabilidade da família dos Bragançãos que, juntamente com mais meia dúzia de Ricos-Homens para o restante Condado/Reino tinham a obrigação de defender, povoar e colonizar o território que governavam. Às vezes socorriam-se de ordens religiosas, mas isso não é o mesmo que ter o povoamento a cargo delas - até porque, com frequência, recorriam à criação de concelhos, como foi o caso de Rebordaínhos, embora, desgraçadamente, não tenhamos documentação directa que o ateste.
O mais ou menos em História (ou seja, as generalizações, a falta de rigor e objectividade que refere e se atribui) é tão grave como em qualquer outro saber: se os laboratórios medirem mais ou menos a dose dos produtos que põem nos medicamentos, o paciente corre o risco de morrer, porque nas consequências não há mais nem menos.
Não leve isto a peito, nem o veja como acinte, antes, como uma defesa do rigor historiográfico, pois a História é, para mim, tão minha dama como Rebordaínhos.
Como lhe disse na resposta anterior, é verosímil que o conhecimento da arte de "ensemblar" venha dos trabalhos de construção das igrejas, ideia que muito lhe agradeço.
Sobre a origem da palavra, limitei-me a dar uma opinião - apenas isso, porque a mais não me atrevo. Correria o risco de alguém, com toda a propriedade, me dar a resposta que Apeles deu ao sapateiro.
Cumprimentos
Resumindo, sem concluir, o bonito e curioso texto que originou estas trocas de comentários deu frutos suculentos. Quando o li a primeira vez, comecei logo a pensar:
-Lá vem o mirandês outra vez, com as suas palavras esquisitas.
Mas estas reflexões mostraram-me que os enxambladores propriamente ditos -mais no sentido de quem encaixava peças grandes de mobiliário de igreja ou juntava, também por encaixe, diferentes partes das estruturas de madeira dos telhados, por exemplo - pertencem a uma profissão antiga, e tinham esta designação há muito tempo, tanto no campo como na cidade. Em Rebordainhos enxamblar ficou com o sentido metafórico.
Aceito bem quase todas as críticas construtivas de Fátima Stocker. Por mim, não me revejo em Apeles nem no sapateiro.
Cumprimentos
Bonifácio
Deixando-nos de rodeios, acho que enxamblador também quer dizer, simplesmente, marceneiro ou carpinteiro.
Cumprimentos,
Bonifácio
Rebordainhos tem sido para mim uma fonte de inspiração, desde o primeiro dia em que lá entrei. Hoje apresento a ideia “Rebordainhos Ecológica” no âmbito de um plano por mim gizado tendo em vista a melhoria e desenvolvimento sustentado da União de Freguesias de Rebordainhos e Pombares, que cada leitor, ponderando as suas posses e habilidades, poderá apadrinhar ou rejeitar, garantindo-se sempre o respeito escrupuloso do livre-arbítrio de cada um.
Para abrir, as autoridades mandarão exarar um edital com a proibição absoluta, sob pena de pesadíssima coima aos infratores, de todos os veículos que utilizem motores de combustão. Não haverá quaisquer exceções, pelo que se chama a atenção dos mais distraídos de que, tanto nas vias principais como nas secundárias, dentro da localidade, também serão banidos os tratores agrícolas, as camionetas de carreira, as ceifeiras-debulhadoras, as retroescavadoras e, de um modo geral, tudo o que mexa e deite fumo. Para calar as vozes de protesto que dizem que não pode ser porque assim nunca mais chegavam aos Vales, a Afonsim, ao Cabeço Cercado, às Eiras, e a outras terras ainda mais afastadas (que também precisam de ser cultivadas), eu tiro um coelho maravilhoso da cartola, que não dando, infelizmente, aumento de ordenados e reformas a ninguém, é portador da solução que nos protegerá das primeiras pedras que atiram a esta engrenagem ecológica: utilizar, novamente, os animais de tiro!
Desculpem, mas tenho de interromper a narrativa, porque a minha vida não é só isto!
Até à próxima,
Bonifácio
Bonifácio
Vossemecê saiu-me um pândego!
Estou-lhe muito grata pelas sua participações, as duas primeiras porque acrescentam ideias (embora essa do Mirandês não colha muito) e a última porque, efectivamente, me fez sorrir neste dia tão enfarruscado.
Cumprimentos
O Exmo. Sr. D. Bonifácio disse e transcrevo.
...Serão banidos, tudo o que mexa e deite fumo... Agora pergunto:
Nesse role também são incluídos os caga lumes?!
O Rebordainhense
No ROL de D. Bonifácio de Alarcão não entram cagões.
Pois não porque o Rei dos cagões,D. Bonifácio de Alarcão, não deixa!
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