O Entrudo integra-se no conjunto das festas dos rapazes. Apesar der ser deles, toda a gente participava na folia, rindo se a partida era feita a outros, zangando-se se a vítima era o próprio. As partidas, embora repetidas todos os anos, apanhavam sempre alguém desprevenido. Casa em que se esquecessem de cerrar a porta, o mais certo era receber, atirado para se escaqueirar no sobrado, um cântaro de barro cheio de cinza, buralhacos e bosta de vaca! Que zangadas ficavam as mulheres, mormente se o soalho fora esfregado havia pouco tempo!
As façanhas eram tanto mais parodiadas quanto mais má raça fosse a vítima. À mulher mais áspera roubava-se-lhe o cântaro que lhe haveria de entrar em casa; a rapariga mais arisca, com ares de “não-me-toques que não sou para o teu bico”, não escapava sem ser enfuliçada com carvão, ou graxa e, por cima, a farinha e os ovos.
Tudo acontecia pelo dia fora. Quase todos se vestiam de matrafonas (as do João Santacombinha ficaram célebres) e as ruas do povo eram corridas nesses desfiles, ora dançantes e cantantes, ora andantes. A certa altura chegava a pateada: a rapaziada, que durante o ano fora registando os deslizes de toda a gente, punha-os em forma de teatro. Era um pagode, sobretudo porque se sabia muito bem quem eram os alvos da chacota. Creio que as seguintes quadras se integram num desses momentos:
Indo eu por ‘i abaixo.............................. Indo eu por ‘i abaixo
Ai que desgraça tamanha ..................... A tocar a cavaquinha
Escorreguei, dei um peido, ................... Deixei a mulher na cama
Morde lá essa castanha! ....................... A ranhar a passarinha!
Tenho uma guitarra nova ......................Tenho uma guitarra nova
Feita do pau das urtigas .........................Feita do pau das colheres
Cada vez que toco nela ...........................Cada vez que toco nela
Faço mijar as raparigas! .........................Faço mijar as mulheres!
As façanhas eram tanto mais parodiadas quanto mais má raça fosse a vítima. À mulher mais áspera roubava-se-lhe o cântaro que lhe haveria de entrar em casa; a rapariga mais arisca, com ares de “não-me-toques que não sou para o teu bico”, não escapava sem ser enfuliçada com carvão, ou graxa e, por cima, a farinha e os ovos.
Tudo acontecia pelo dia fora. Quase todos se vestiam de matrafonas (as do João Santacombinha ficaram célebres) e as ruas do povo eram corridas nesses desfiles, ora dançantes e cantantes, ora andantes. A certa altura chegava a pateada: a rapaziada, que durante o ano fora registando os deslizes de toda a gente, punha-os em forma de teatro. Era um pagode, sobretudo porque se sabia muito bem quem eram os alvos da chacota. Creio que as seguintes quadras se integram num desses momentos:
Indo eu por ‘i abaixo.............................. Indo eu por ‘i abaixo
Ai que desgraça tamanha ..................... A tocar a cavaquinha
Escorreguei, dei um peido, ................... Deixei a mulher na cama
Morde lá essa castanha! ....................... A ranhar a passarinha!
Tenho uma guitarra nova ......................Tenho uma guitarra nova
Feita do pau das urtigas .........................Feita do pau das colheres
Cada vez que toco nela ...........................Cada vez que toco nela
Faço mijar as raparigas! .........................Faço mijar as mulheres!
Caída a noite, estava na altura de os rapazes se voltarem a juntar para fazer o Entrudo – um boneco de palha a que vestiam como homem, com chapéu e tudo! Depois discutiam a que porta iriam pô-lo e, então, afixavam-lhe um cartapácio no peito, com dizeres alusivos à pessoa em causa. Dos bons ou maus bofes da pessoa, dependia a reacção quando, quarta-feira pela manhã, abrisse a porta e desse de caras com o mono.
Quarta-feira é preciso que o Entrudo morra, para que o espírito dos homens se coadune com os tempos quaresmais. Posto num carro de bois puxado por dois ganapos, o boneco da véspera é levado até ao prado. Aí, no meio de grande algazarra e dichotes, alguém lhe chisca fogo, ardendo por completo, num adeus até para o ano.
Que digo eu? Não é até para o ano, é até daqui a vinte dias, quando se proceder à serra das velhas e ao casamento das novas. Os quarenta dias de tristeza da quaresma são longos demais para que não tenham de ser interrompidos com alguma alegria.
__
As palavras que escrevi pouco mais são do que aquilo que ouvi contar. Nascida num tempo em que a gente nova tinha emigrado ou estava na guerra, a pouco assisti, porque também eu saí, ainda menina, e nunca mais pude voltar à aldeia no tempo do Entrudo. Agradeço a todos quantos me queiram corrigir ou fazer algum acrescento. Prometo que farei todas as alterações necessárias.
A fotografia que ilustra o artigo foi publicada pela minha irmã Augusta num artigo que escreveu sobre o assunto, embora versando outro aspecto: o das refeições. Está aqui: siga a ligação.
As quadras transcritas foram-me ensinadas por minha mãe.
Quarta-feira é preciso que o Entrudo morra, para que o espírito dos homens se coadune com os tempos quaresmais. Posto num carro de bois puxado por dois ganapos, o boneco da véspera é levado até ao prado. Aí, no meio de grande algazarra e dichotes, alguém lhe chisca fogo, ardendo por completo, num adeus até para o ano.
Que digo eu? Não é até para o ano, é até daqui a vinte dias, quando se proceder à serra das velhas e ao casamento das novas. Os quarenta dias de tristeza da quaresma são longos demais para que não tenham de ser interrompidos com alguma alegria.
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As palavras que escrevi pouco mais são do que aquilo que ouvi contar. Nascida num tempo em que a gente nova tinha emigrado ou estava na guerra, a pouco assisti, porque também eu saí, ainda menina, e nunca mais pude voltar à aldeia no tempo do Entrudo. Agradeço a todos quantos me queiram corrigir ou fazer algum acrescento. Prometo que farei todas as alterações necessárias.
A fotografia que ilustra o artigo foi publicada pela minha irmã Augusta num artigo que escreveu sobre o assunto, embora versando outro aspecto: o das refeições. Está aqui: siga a ligação.
As quadras transcritas foram-me ensinadas por minha mãe.
4 comentários:
Não conhecia as quadras... eram uns poetas atrevidos, os homens de outros tempos, mas o que não vai a bem tã pouco vai a mal...eles é que sabiam!
Quanto au antrudo, mais couza menos couza, era ixo mesmo... a da panela de barro chea de lixo, escachada in caza das pipis, já me andaba a moer o miolo! Mas... ai pernas pra que bos kero!
Pouca bergonha agora já nem deixam intrudar nem nada ...Gostei munto, Chi,coração
Não conhecia as quadras, mas a história dum entrudo mais ou menos parecido foi-me contada pelos meus pais quando era miuda.
Um abraço e bom fim de semana
Tonho
Obrigada por teres gostado e por confirmares as informações que dei.
Beijos
Elvira
Mais coisa, menos coisa, as brincadeiras de entrudo repetem-se por todo o lado.
Beijos
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